As dinâmicas que embalam os agroextrativistas que constroem a Rede estão baseadas no envolvimento político-comunitário das famílias e nos princípios que as une. Reúne agricultores(as), pescadores(as), extrativistas, vazanteiros(as), quilombolas, indígenas, Povos do Cerrado.

Essas dinâmicas são práticas sociais das quais nos tornamos parte – monitores, famílias, conselho, assessoria –, nos apropriando de saberes e fazeres para intervir na realidade, criando e recriando a atuação em rede.

 

Dinâmica Socioprodutiva dos Agroextrativistas da Rede

É uma configuração da dinâmica político-comunitária territorial no bioma Cerrado, onde os agroextrativistas organizados em núcleos comunitários (compostos de 5 a 15 famílias) discutem, planejam e realizam a produção agroecológica e o manejo sustentável do Cerrado, unindo de forma solidária, simultânea e recíproca comunidades e municípios, formando territórios em rede. Esta dinâmica é marcada pela participação social, formando uma malha horizontal que une famílias, monitores, conselheiros e assessoria e que têm como espaços deliberativos os Fóruns Territoriais e Assembleias.

Processo de Capacitação de Agroextrativista a Agroextrativista
É uma dinâmica política própria da Rede, que busca estabelecer uma maior autonomia dos agroextrativistas em relação à assessoria técnica, gestão, produção e organização. Isso se dá por meio do processo de aprendizagem-ação do sujeito, do saber fazer técnico e político dos monitores(as) agroextrativistas do Cerrado. Desse modo, os monitores(as) agroextrativistas escolhidos de forma participativa pelas famílias no núcleo comunitário participam do programa de formação em agroecologia de dois anos, conduzido em sistema de alternância: atividades presenciais no Centro de Formação em Agroecologia, no CEDAC em Goiânia/GO e atividades mensais no Núcleo Comunitário.

No trabalho da Rede de Comercialização Solidária, o que alimenta e fortalece sua trama é a solidariedade, princípio que vem sendo buscado e praticado permanentemente pelos membros da Rede. Isso significa compartilhar conhecimento. A família deve ser o ponto de partida e de chegada de todo o processo da Rede. Outro objetivo deste trabalho é valorizar o conhecimento e a cultura do próprio agroextrativista, ou seja, buscar que ele/ela acredite em si mesmo, na sua capacidade de observar, de compreender a natureza. É entender que as soluções estão na sua própria realidade e não em soluções imediatas como no caso dos agroquímicos altamente caros e causadores de impacto ambiental sobre a saúde humana.

Assim, os monitores(as) assumem também o compromisso de capacitar as famílias do núcleo comunitário, realizando reuniões, oficinas, dias de campo, mutirões comunitários, campos de demonstração agroecológica e áreas de monitoramento. Esse comprometimento comunitário do monitor(a) com seu núcleo é fundamental para contribuir no processo de estudo das famílias sobre agroecologia. Isso possibilita que elas construam conhecimento, inovem e implementem o manejo dos agroecossistemas como forma de aumentar a sua eficiência ecológica, manter a capacidade produtiva e automanutenção do agroecossistema.

Esse modelo de agricultor/a-para-agricultor/a vem sendo aperfeiçoado. Em 2019, a Rede passou a expandir os espaços de formação por meio dos Centros de Vivência Comunitária Agroecológica em Rede – CEVCAR, sistema on farm de inovação e intercâmbio do conhecimento agroecológico. Com essa territorialização dos espaços de formação, se busca dar escala à agroecologia e ao extrativismo sustentável no nível local/municipal.

Sistema Participativo de Garantia (SPG) Orgânica, Gênero e Crédito em Rede
O SPG foi construído pelos agroextrativistas participantes da Rede, tendo como base os princípios da agroecologia. O formato de operação do SPG tem como elementos centrais a equidade de gênero e o acesso ao crédito com controle social e comunitário. A partir do envolvimento direto dos agroextrativistas, o SPG busca estimular a prática da autogestão, as relações de trabalho equitativa entre homens e mulheres na unidade produção familiar, a capacitação, a produção, o manejo, a agroindustrialização e a comercialização de forma responsável, transparente, justa e solidária com o ambiente e os povos do Cerrado. O intercâmbio entre os núcleos para as visitas de monitoramento contribui para a valorização e a troca do conhecimento tradicional. O CEDAC é credenciado perante o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, o qual reconhece o modelo de SPG adotado pela Rede.

De maneira complementar ao SPG, em 2019 foi criado o Fundo Garantidor de Agroecologia e Biodiversidade (FGABio), com o objetivo de fortalecer a agroecologia em escala territorial. O FGABio tem por princípio respeitar valores e culturas associadas à biodiversidade e se propõe viabilizar direta e/ou indiretamente recursos financeiros junto com assessoria técnica e organização comunitária em rede. O Fundo promove o fomento de modos de vida sustentáveis e estratégias de adaptação e mitigação às mudanças do clima, conservação da biodiversidade, produção agroecológica, organização de comunidades agroextrativistas e agricultores familiares. O sistema de governança do FGA BIO incorpora a dinâmica de autogestão participativa com controle social na tomada de decisão sobre o crédito no núcleo comunitário.

Como parte do processo de desenvolvimento do SPG e do FGABio, o CEDAC construiu junto com as comunidades evidências para a inclusão de normas voluntárias que valorizam a dimensão de gênero no âmbito das comunidades e organização. E assim desenvolveu o Selo Mulheres Sociobio, que valoriza a origem e as mãos que produziram os produtos, dando visibilidade ao trabalho das mulheres agroextrativistas e promovendo equidade de gênero na unidade familiar, na comunidade e na organização social.

Processos de Autogestão dos Empreendimentos em Rede
A economia agroextrativista no Cerrado é marcada por uma diversidade de espécies manejadas e/ou cultivadas, muitas delas já aproveitadas comercialmente. Todavia, geralmente estão sujeitas a uma lógica de exploração com um valor ínfimo pago ao agroextrativista. A construção da Rede buscou viabilizar a garantia de um preço justo e a inserção dos diversos produtos no mercado, fortalecendo a cultura das comunidades, seu maior patrimônio, e para a diversidade dos cerrados.

A autogestão dos empreendimentos em rede é um sistema compartilhado que permite a tomada de decisão a partir da participação direta das famílias organizadas nos núcleos comunitários. Nesse espaço, é feito o planejamento da produção e a definição do preço justo dos produtos, o qual posteriormente é discutido com os conselheiros e a assessoria.